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Se aprovado, novo sistema eleitoral deve fortalecer políticos poderosos e prejudicar jovens e ativistas

Conheça o modelo que será votado nesta semana na Câmara dos Deputados

Um incompreendido, um pobre coitado: todos o viram sempre como um picareta comprometido com os piores elementos da política brasileira. Agora, que tentam derrubá-lo, não faltam intelectuais para exaltar suas virtudes.

— É melhor com ele do que sem ele — alerta Maria do Socorro Braga, professora de Ciência Política da Universidade Federal de São Carlos.

Mas é isso: querem acabar com o quociente eleitoral. E quem lidera a trama é Eduardo Cunha, o controverso presidente da Câmara dos Deputados, com o apoio do seu partido gigante, o PMDB. Na próxima terça-feira, Cunha levará ao plenário a votação do chamado "distritão", uma proposta que à primeira vista parece simpática.

Veja que simples: pelo distritão, o Estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, elegerá seus 31 deputados federais da maneira mais óbvia possível — entre todos os candidatos, os 31 mais votados entram na Câmara. Ponto.

— Pode parecer o mais justo, mas o resultado será o fim da participação das minorias e da renovação no Congresso. Não é à toa que hoje o sistema é diferente — pondera o juiz eleitoral Márlon Reis, idealizador da Lei da Ficha Limpa e membro da Coalizão pela Reforma Política Democrática.

Há uma explicação mais didática para o modelo atual logo abaixo, mas, em resumo, hoje os votos de todos os candidatos de um mesmo partido ou coligação são somados. Se o partido ou coligação atingir uma vez o quociente eleitoral — que é o número mínimo de votos necessários, raramente alcançado por um candidato só —, leva uma cadeira no parlamento. Se atingir duas vezes, leva duas, e assim por diante. Quem ocupa essas vagas conquistadas, aí sim, são os mais votados do partido.



De fato, o sistema tem distorções. Eventualmente, um postulante como Tiririca supera sozinho o quociente eleitoral e elege parlamentares na carona. Em outros casos, candidatos com votação expressiva, como Luciana Genro em 2010, ficam de fora porque o partido não alcançou o quociente.

Todo modelo eleitoral tem falhas, diz o cientista político Alberto Carlos Almeida, mas o atual pelo menos garante certa diversidade no Congresso.

— O representante de um grupo minoritário, que defende a inclusão social de pessoas com deficiência, por exemplo, ou que milita no movimento LGBT, dificilmente estará entre os mais votados de um Estado. Portanto, jamais se elegeria com o distritão. Mas hoje, se a soma dos votos do seu partido ultrapassar o quociente eleitoral, uma cadeira pode ser dele — analisa Almeida, autor do best-seller A Cabeça do Brasileiro.

Embora um grupo de 60 cientistas políticos de universidades do país inteiro tenha enviado na sexta-feira uma carta para Eduardo Cunha contestando o distritão, há profissionais da área (raros, é verdade) que defendem o modelo.

— As minorias terão que ampliar seu repertório político para conseguir voto. O que, aliás, é muito justo: no mundo de hoje, ser monotemático e exigir representação no Congresso sem abordar as grandes questões nacionais é uma discrepância. Não existe política econômica homossexual ou política externa homossexual — diz o cientista político Luiz Felipe d'Avila, diretor-presidente do Centro de Liderança Pública, organização paulista dedicada a formar novos líderes.

E há justamente aí, nos novos líderes, outro ponto de inflexão.

Se a soma dos votos de um partido passa a não valer mais nada — e, portanto, candidatos da mesma sigla deixam de se ajudar mutuamente quando conquistam eleitores —, é natural que as legendas se concentrem em poucos nomes. Afinal, se lançar muitos candidatos, um acaba tirando voto do outro, e não mais agregando para o quociente eleitoral.

— É evidente que os partidos só vão apostar nos mesmos, nos que já são bem votados. Que interesse terá uma sigla em ver jovens lideranças disputando eleitores com quem tem mais chance de vencer? — questiona o juiz eleitoral Márlon Reis. — A renovação do parlamento se torna impossível.

Até o ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, correligionário de Cunha e principal articulador político do governo, concorda que o distritão tem esse porém.

— De fato, haverá um aumento na dificuldade para novos quadros se elegerem — reconhece ele. — Mas, se queremos que a vontade popular seja acolhida em sua plenitude, devem ser eleitos aqueles nomes que obtiverem a maior votação, representando assim a real vontade do eleitor.

Certo. Mas se as minorias e os novos líderes terão dificuldade nas eleições, qual é o perfil do político que deseja o Distritão? Certamente o que se identifica pouco com os grupos recém-citados. O próprio Eduardo Cunha, um expoente da bancada evangélica com quatro mandatos na Câmara, é um bom exemplo.

Também é preciso dinheiro para bancar campanhas caras.

— Como os partidos vão reduzir muito o número de candidatos, o valor total gasto com campanhas deve baixar. Mas o custo de uma única campanha certamente vai crescer, porque o candidato precisará pedir votos no Estado inteiro, e não mais só na região onde é popular. Hoje, sem o distritão, fica um candidato em cada canto, o que é bom só para o quociente eleitoral — avalia Luiz Felipe d'Ávila, o cientista político favorável ao distritão, embora seu modelo favorito seja o voto distrital puro.

Eduardo Cunha vem comprando briga em nome do novo sistema — que, na verdade, foi idealizado pelo vice-presidente Michel Temer. Existem outros países do mundo que adotam o distritão, vale lembrar: Afeganistão e Jordânia.

Na semana passada, ao perceber que a comissão responsável por debater a reforma política na Câmara poderia rejeitar a proposta, Cunha usou uma brecha do regimento para atropelar o relatório do grupo e mandar o distritão direto para o plenário — a votação deve ocorrer na terça-feira. Com a façanha de unir PT e PSDB contra o seu projeto, o peemedebista ainda conta com bom apoio no parlamento, mas não se sabe se será suficiente para aprovar o novo sistema.

— Cunha quer ser presidente da República. Se vão aprovar ou não, é o de menos. O mais importante para ele é dominar a pauta, mostrar que está liderando um projeto de reforma. Se der errado, ele dirá que tentou — interpreta um colega de partido.

Fonte: Zero Hora Notícias

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