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Salários: alimento para a inflação?

De nada adiantou a sugestão do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. No início deste mês, o homem-forte da política monetária brasileira, temendo novas pressões inflacionárias, pediu que os trabalhadores não exigissem aumentos salariais, e convocou “toda a sociedade” a fazer sua parte do combate à inflação. O discurso pouco teve efeito entre os sindicatos, que já começaram a se mobilizar para as convenções coletivas do segundo semestre e avisam: os reajustes exigidos serão maiores do que a inflação, a fim de repor perdas salariais e aumentar o poder de compra dos trabalhadores – fato de arrepiar os poucos cabelos do presidente do Banco Central e que pode elevar ainda mais a já alta previsão de inflação para 2008.

Ao menos quatro categorias de peso terão data-base nos próximos meses: metalúrgicos, químicos, bancários e petroleiros – empregados de setores que exibem recordes de lucros e produção, como as montadoras, as indústrias químicas e os bancos. Apesar de os sindicalistas alegarem que os reajustes propostos estão abaixo do aumento da produtividade dos trabalhadores, e que isso evitaria pressões inflacionárias, o possível impacto das negociações na inflação corre aos burburinhos no meio econômico. Quando confrontados com essa hipótese, porém, os sindicatos são categóricos: a inflação são outros quinhentos. “Essa não é, de forma nenhuma, uma preocupação, porque o que tem puxado a inflação é o setor alimentício e o mercado financeiro mundial”, comenta o presidente do Sindicato dos Bancários de Curitiba, Otávio Dias.

Para muitos economistas, no entanto, apontar quem é o vilão pela alta dos preços já não é suficiente para combater ou impedir a escalada da inflação no país. “A idéia de isolar as diferentes causas da inflação é ingênua”, diz o economista e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), José Márcio Camargo. Segundo ele, a inflação é provocada por pequenas pressões, que se acumulam e dão origem a uma grande pressão. “Cada um desses aspectos não é significativo por si só, mas, quando todos se juntam, a pressão se torna significativa.” Ele não hesita em afirmar que reajustes salariais substanciais poderiam, sim, provocar uma pressão inflacionária, pois alavancariam a inflação de demanda. Trocando em miúdos: quanto mais dinheiro no bolso, maior o poder de consumo da população, mais dinheiro circulando e maior a inflação.

Os sindicalistas reforçam, no entanto, que há outras razões para que os reajustes salariais sejam maiores do que a inflação, como explica o diretor-presidente do Sindicato dos Químicos do Estado do Paraná (Siquim), Elton Marafigo. “A nossa maior preocupação é com a reposição salarial, pois temos uma perda acumulada nos últimos anos. Os salários estão defasados.” De prancheta em punho, o economista do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Sandro Silva, confirma: de 1998 a 2003, a perda de poder aquisitivo dos salários dos trabalhadores chegou a 30% – e os últimos anos têm sido um momento de recuperação.

Em 2007, asseguram as planilhas do Dieese, 88% dos trabalhadores conseguiram reajustes salariais acima da inflação. A porcentagem, que era de apenas 19% em 2003, veio aumentando progressivamente nos últimos cinco anos, e é mais um argumento dos trabalhadores a favor dos ganhos reais. “O salário tanto não pressiona a inflação que temos tido aumento real há anos seguidos e em nenhum momento o índice disparou. Esse discurso não cola”, argumenta o presidente da Central Única dos Trabalhadores do Paraná (CUT-PR), Roni Barbosa.

O economista do Dieese reforça que o ganho real dos trabalhadores, que foi de 1% a 2% ao ano nos últimos acordos, ainda é “insignificante” em relação ao crescimento da economia – 5,4% em 2007 – e da produtividade brasileiras. “Tudo isso está indo para as empresas, e agora querem frear a recuperação da renda do trabalhador com a desculpa de que vamos acelerar a inflação?”, questiona Silva.

Espiral inflacionária

Para os economistas, no entanto, a preocupação com os reajustes salariais vai além de uma desculpa. O grande medo do Banco Central é que as negociações impulsionem uma espiral inflacionária, como explica o professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Luciano Nakabashi. “Se você aumenta o salário dos trabalhadores, você eleva os custos das empresas e elas podem repassar esse ônus para os preços” – tal como ocorreu com algumas negociações salariais no primeiro semestre, quando a maioria das categorias teve ganho real entre 1% e 2%.

De repasse em repasse, a inflação brasileira tomou vida própria e, dos aumentos iniciais nos preços dos alimentos e do petróleo, se estendeu aos serviços e produtos – por isso o receio de Meirelles e dos economistas com relação aos aumentos salariais. “Quando começarem os reajustes, a inflação pode ir a uma terceira geração, e aí vai se auto-alimentando”, diz a professora do Instituto Superior de Administração e Economia (Isae/FGV), Virene Matesco.

Para ela, a capacidade de difusão da inflação no Brasil é alta. “Ninguém quer ficar atrás quando o assunto é inflação: se aumentou o preço da alface, eu vou aumentar o preço do automóvel. Nós temos essa cultura da indexação”, diz Virene, referindo-se à prática de reajuste automático dos preços diante de um aumento nos índices da inflação.

Ninguém se arrisca a dizer qual será, de fato, o impacto das negociações salariais na inflação do segundo semestre ou de 2009 – até porque os próprios índices de reajuste ainda não foram definidos em convenções coletivas –, mas é consenso entre os economistas que os aumentos criarão, sim, uma pressão inflacionária. A bola de cristal só é consultada sem pudores quando se trata de quais serão as medidas tomadas pelo Banco Central: aumento progressivo de juros – o que deve tornar as negociações salariais ainda mais acirradas.

Fonte: Gazeta do Povo

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