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Contra fator, aposentado busca se "desaposentar" e pedir novo benefício

Pessoas que se aposentaram mais jovens e tiveram seus benefícios reduzidos por conta do fator previdenciário ou por receberem aposentadoria proporcional apostam na "desaposentação" para tentar melhorar seus vencimentos.

Segundo advogados e entidades consultadas pelo G1, esse tipo de processo é recente no país e começa a proliferar nas varas previdenciárias. Poucos casos já chegaram ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas ainda não há consenso no próprio tribunal sobre o tema.

A desaposentação nada mais é do que o ato de renunciar ao atual benefício para obter um novo em condições mais favoráveis. Mas só vale para quem continuou trabalhando ou trabalhou por algum tempo depois de aposentado. Ao fazer as contas anos depois, a pessoa percebe que seu benefício seria melhor se fossem consideradas as condições atuais. Como, uma vez aposentado, não é possível pedir uma revisão ao próprio Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), esses beneficiários optam por ir à Justiça.

De acordo com advogados ouvidos pelo G1, ações do tipo começaram a ser protocoladas alguns anos depois da adoção do fator previdenciário, em 1999, quando aposentados sob o mecanismo refizeram as contas após atingir mais idade e perceberam que podiam ter um benefício maior. O mesmo aconteceu com que se aposentou com benefício proporcional, o que era permitido até o fim de 1998.

No fim de maio, o Congresso Nacional aprovou o fim do fator, que, na prática, reduz o benefício de quem se aposenta mais jovem, independentemente do tempo de contribuição. O mecanismo tenta inibir as aposentadorias precoces para ajudar as contas da Previdência. O governo reagiu e os ministros da Fazenda e do Planejamento recomendaram que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vete o fim do fator. O presidente tem até a próxima terça-feira (15) para decidir, segundo o governo - pela Constituição, o prazo é de 15 dias úteis após o recebimento do projeto.

Não há nenhuma lei que permita a desaposentação, mas não também não existe proibição de se tentar obter uma nova aposentadoria na Justiça. Consultado pelo G1, o Ministério da Previdência disse que "não é contra nem a favor da desaposentação. A legislação brasileira é que não permite. De acordo com a legislação, a aposentadoria é irreversível e irrenunciável a partir do recebimento da primeira parcela", informou a assessoria da pasta por e-mail. Segundo especialistas, a preocupação do governo é de que os gastos públicos podem aumentar.

O principal argumento das ações sobre o tema que tramitam na Justiça é o de que é injusto que os beneficiários que continuam trabalhando não tenham como reaver as contribuições feitas após a aposentadoria.

É o caso do analista de sistemas Carlos Paes, de 58 anos, morador de São Bernardo do Campo, no ABC paulista. Ele se aposentou em 1998, antes do fator previdenciário, com 46 anos de idade. "Fiz os cálculos e percebi que não compensava esperar porque ia entrar a nova lei do fator previdenciário e o valor da aposentadoria ia cair muito."

Paes disse que, depois de se aposentar, trabalhou cerca de seis anos com um negócio próprio. Em 2004, conseguiu um emprego para voltar ao mercado de trabalho com registro em carteira. "Foi uma sorte conseguir emprego. É que na área que trabalho, mainframe (computador de grande porte), a garotada não se interessa muito e acaba sobrando espaço para pessoas mais experientes."

Recentemente, soube que podia tentar melhorar o benefício se levasse em conta os últimos anos que trabalhou. Foi aí que entrou na Justiça com pedido de desaposentação. "Eu não vou ficar esperando regulamentarem isso, porque acho que é meu direito (obter uma aposentadoria melhor)." Segundo os cálculos feitos pelo advogado de Carlos Paes, se ele se aposentasse com a situação atual, seu benefício seria 70% mais alto.

Para Benedito Marcílio, vice-presidente da Federação dos Aposentados do Estado de São Paulo e membro do Conselho Nacional de Previdência Social, a desaposentação é uma alternativa para os aposentados que continuam trabalhando.

Segundo dados do IBGE, em 2008, os aposentados e pensionistas no país somavam 22 milhões. Entre eles, 6,7 milhões estavam ocupados - cerca de 30% do total.

"O ideal seria se tivéssemos aposentadorias com critérios justos onde o cidadão que trabalhasse 30, 35 anos, recebesse uma aposentadoria que lhe garantisse a sobrevivência. (...) Hoje em dia os critérios são perversos com esse fator previdenciário. Quem se aposenta tem perda de cara de mais de 35% do que se tivesse trabalhando. (...) São mais de 2 milhões de aposentados com carteira assinada. A desaposentação acaba sendo uma forma de corrigir distorções."

Benedito Marcílio diz que o fim do fator previdenciário é uma das bandeiras do movimento de aposentados. "Se o Lula vetar vai ter que assumir os desgastes desse veto. A responsabilidade é dele e ele vai pagar por isso, afinal é ano de decisão política", afirma.

Ação na Justiça

Como a procura por processos de desaposentação começou a crescer, no fim do ano passado a Defensoria Pública da União (DPU) no Paraná entrou na Justiça para possibilitar que todos os aposentados possam pedir por via administrativa a revisão do seu benefício, sem necessitar do processo por desaposentação.

A ação pedia uma liminar para que o INSS começasse a revisar os benefícios de imediato, mas a Justiça negou. O Ministério Público Federal no estado opinou pela rejeição do processo por entender que não é dever da DPU fazer pedido em prol da coletividade. O processo está com juiz para uma decisão.

O defensor público Alfeu Eleandro Fabiane diz que se a Justiça considerar o pedido procedente (válido) na 1ª instância, mesmo que a Previdência recorra, pode ser um "precedente positivo" para ação individual. "Mas conto com a possibilidade de que seja improcedente na primeira instância. Se acontecer, vamos recorrer. No TRF 4 (da região do Paraná), há entendimento de que a desaposentação possa ocorrer, mas eles dizem que o aposentado tem de devolver todos os valores já recebidos. Somos contra porque não recebeu indevidamente, tinha o direito."

Eleandro Fabiane diz que o tema deve ter um consenso em breve no STJ ou chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF). "Como a questão da aposentadoria é tratada como direito fundamental, provavelmente isso vai acabar gerando questão constitucional para o STF. É uma questão nova. Pontualmente algumas pessoas conseguem esse direito, mas pontualmente. Não há decisões de maior alcance." Segundo o defensor, só na DPU de Curitiba (PR) há cerca de 20 casos de pessoas pedindo desaposentação em andamento.

Quem pode pedir

Segundo a advogada Melissa Folmann, do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, só é possível tentar a desaposentação para quem continuou trabalhando após começar a receber o benefício. "Nos casos em que a pessoa que se aposentou cedo, sofreu incidência do fator previdenciário, e que após ter se aposentado manteve o fator contributivo ou passou a contribuir com valores maiores, vale a pena pedir a desaposentação."

Ela afirma, porém, que trata-se de um processo longo. "Demora entre cinco e sete anos. É um processo longo e deve ir ao Superior Tribunal de Justiça, uma vez que muitos juízes de primeira e segunda instância têm negado os pedidos." A advogada disse que a ação deve pedir a renúncia do benefício por outro melhor, e não a revisão. "Desaposentação não é revisão. A revisão ocorre por um erro cometido. Na desaposentação, é preciso provar que contribuiu depois de se aposentar e que espera um novo benefício." Melissa afirma ainda que é necessário fazer adequadamente os cálculos para saber se o processo vale a pena.

Regulamentação

Para o professor Fábio Zambitte, especialista na área de Direito Previdenciário, autor de "Desaposentação: o caminho para uma melhor aposentadoria" e servidor de carreira no Ministério da Previdência, a desaposentação é um "instrumento adequado", desde que não seja usado para fraudes.

"Defendo que tenha ocorrido pelo menos um ano de contribuição. Mas o ideal é que isso seja regulamentado. Cada juiz analisa conforme seu entendimento, e o Judiciário ocupa esse vácuo de poder, já que o legislador não resolve."

O G1 identificou pelo menos dois projetos no Congresso que criam regras para a desaposentação, mas ainda estão em estágios iniciais de tramitação.

Zambitte também crê no veto ao fim do fator e considera que pelo sistema atual, o melhor é que o mecanismo continue vigorando. Ele afirma, porém, que a implantação de uma idade mínima poderia para aposentadoria poderia resolver a questão.

Preocupação

Para os advogados que atendem aos aposentados que buscam melhorar o benefício, a preocupação é sobre o tema chegar ao Supremo Tribunal Federal.

O advogado Danilo Perez Garcia afirmou que atende diversos aposentados com esse perfil e já chegou a obter uma sentença favorável na primeira instância, mas a Previdência recorreu. Nesse caso, o benefício atual de R$ 1,5 mil iria para R$ 2,9 mil se considerados os últimos anos de trabalho.

Garcia destaca que muitos tribunais têm aceitado a desaposentação, mas determinando que o segurado devolva todos os valores recebidos anteriormente. "A Previdência alega que se for concedida a desaposentação, o segurado tem de devolver. Mas entendemos que a aposentadoria naquele momento foi legal. Só se deve devolver valores no caso de concessões indevidas ou fraude." O advogado destaca que em um caso que chegou ao STJ o tribunal opinou pela não devolução.

"São processos novos. Nós começamos a mexer com desaposentação em 2008 e é agora, 2010, 2011, que começa a chegar nos tribunais superiores", afirma Garcia. Para ele, quando muitos casos começarem a aparecer pode ser publicada uma súmula que delibere sobre o assunto.

Viviane Masotti, mestre em direito previdenciário e advogada há 20 anos, é defensora da desaposentação, que classifica com uma "tese jurídica nova". "Acredito na desaposentação, embora ainda seja muito jovem. (...) A desaposentação é hoje praticamente o único caminho que enxergamos para quem se aposentou e continuou trabalhando reaver as contribuições. É um direito que a pessoa tem", afirma.

Ela afirmou que explica aos clientes que se trata de um processo novo, mas não esconde a preocupação com o STF. "Já temos decisões favoráveis no STJ. A preocupação é o STF, se não vão ser revertidas."

Contra

Contrário à tese, o advogado Mauricio Maluf Barella, especialista em direito tributário, afirmou que é procurado para fazer as ações de desaposentação, mas se recusa. "Acho que não vale a pena porque pode cair mais para frente. (...) Eu não costumo brincar com o direito dos outros. Acho que pode acabar piorando a vida de muita gente. Não posso enganar o cliente, tem muitas decisões que pedem a devolução dos valores."

Fonte: Gazeta Online

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