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Sindicalista que tem medo de greve precisa se aposentar

Ele fala de forma professoral. Se emociona muito. Pára a entrevista para chorar. As lágrimas escorrem. Desculpa-se. “Foi muita luta, muitos sacrifícios”. Respira fundo. Pede para voltar a gravar a entrevista. 

Aos 19 anos de idade, depois de uma desilusão amorosa e para “fugir” desse amor, arruma as malas e vai para o Rio de Janeiro, deixando um emprego com carteira assinada em Santos, como ajudante de elétrica. Vai trabalhar, já como eletricista, na construção da ferrovia do aço, no trecho carioca até Volta Redonda.

Já casado, voltou para a Baixada Santista onde sentia estava o seu futuro profissional. “Entendia que, por causa do pólo industrial de Cubatão, essa região era promissora em termos de oferta de emprego”.

Geraldino Cruz Nascimento aos 51 anos de idade, o baiano de Paripiranga (BA), depois de mais de 20 anos de militância sindical, “está”, como ele mesmo observa, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Santos (Sintracomos), desde janeiro último. E por uma fatalidade. O presidente José Antonio Amaral faleceu no dia 22 de janeiro, de câncer.

Amaral tinha acabado de ser reeleito para a presidência do sindicato, no dia 22 de dezembro de 2007. Não assumiu. Quem assumiu foi Geraldino, no dia 2 de fevereiro, o seu vice-presidente, que trabalhou nas empreiteiras Enesa e Montreal Engenharia, da área da Cosipa (Companhia Siderúrgica Paulista, de Cubatão). Foi cipeiro mais eleito nas duas empreiteiras.

Debate Sindical – Quando foi o seu primeiro contato com a vida sindical?
Geraldino Cruz – Foi por volta de 1982, com o senhor Pedro Gomes da Silva, que me falou de sindicato e da importância da organização do trabalhador para conquistar direitos. Naquela época nós, trabalhadores de empreiteiras da área da Cosipa, tínhamos poucos direitos. O trabalhador não tinha almoço, transporte, plano de saúde, uniforme. Eram muitos acidentes de trabalho. Comecei a perceber as coisas, a conhecer o caminho da democracia, o caminho da luta pelos direitos sociais. Foi assim que nasceu a idéia de vir para o sindicato, para organizar a luta porque tinha aqui no sindicato um presidente pelego. Eu tinha 26 anos de idade.

Debate Sindical – Como foi o início do seu engajamento na luta dos trabalhadores?
Geraldino Cruz – Eu era empregado da Enesa. E fui o cipeiro mais votado de toda a história da Cipa (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes) das empreiteiras na área da Cosipa. Fui vice-presidente da CIPA da Enesa por duas vezes.

Debate Sindical – O senhor fez uma greve nas empreiteiras da área da Cosipa?
Geraldino Cruz – Sim. Eu já era da diretoria do sindicato. Eu e mais um colega, em 1987, paramos as empreiteiras na Cosipa. Reivindicávamos a reposição da inflação que, na época, era terrível. Sai de canteiro em canteiro e consegui colocar no pátio da empresa numa faixa de 12 mil trabalhadores. Parou todo mundo.

Debate Sindical – E parou?
Geraldino Cruz – Parou todo mundo.

Debate Sindical – Por quanto tempo?
Geraldino Cruz – Paramos por dois dias. Eu senti que a Polícia Militar (PM) e a vigilância da Cosipa queriam me prender. Por dois dias eu consegui driblar isso. Conseguimos o reajuste salarial, mas paguei um preço muito caro por isso. A empresa pediu a minha cabeça e me tirou da área da Cosipa. Eu fui expulso. Fui preso. Duas viaturas da PM me levaram. Fui colocado para fora e o sindicato na época me desprezou também, porque achou que fui uma pessoa radical.

Debate Sindical – Como você ficou?
Geraldino Cruz – A empresa não me queria dentro da área. Ela continuou a pagar o meu salário, mas não me deixou voltar para o trabalho. A empresa considerou que eu era uma ameaça dentro da área da Cosipa. O sofrimento meu foi muito grande. Passei nove anos assim.

Debate Sindical – Como foi o seu retorno?
Geraldino Cruz – Eu juntei um grupo de 14 pessoas, mesmo da diretoria do sindicato. E consegui falar individualmente com alguns camaradas que foram muito importantes nessa fase da minha vida. Um foi o Douglas Martins de Souza, o José Luiz de Mello (falecido), Marcos Braz de Oliveira, Geraldo Correia, Luiz Carlos de Andrade, Pedro Gomes da Silva, Rivaldo Leão e Dorival Sebastião. E esse grupo de pessoas queria lutar por um sindicato melhor. Depois de muita luta, conseguimos vir para a executiva do sindicato, a partir de 1996. Permaneci por sete anos diretor de Saúde Assistencial. Após esses anos, eu assumi a vice-presidência. Houve também uma dissidência do José Carlos Ribeiro, que era parte de um grupo também importante do sindicato.

Debate Sindical – Na época em que o senhor estava ainda fora do sindicato e disputava eleições, concorriam, às vezes, mais do que duas chapas. Tinha oposição atuante. Hoje as eleições aqui no sindicato são com chapa única. Por que isso?
Geraldino Cruz – Houve uma mudança do estatuto, que dificultou a formação de chapas de oposição. Tem artigo que dificulta e afasta qualquer tipo de oposição.

Debate Sindical – Isso não é ruim?
Geraldino Cruz – É, para a democracia.

Debate Sindical – Como você vê o movimento sindical hoje em comparação ao início da sua militância sindical, na década de 1980?
Geraldino Cruz – Está muito difícil. O movimento sindical se afastou um pouco do trabalhador. Quando você arrecada do trabalhador contra a vontade dele, de uma forma compulsória, que é o imposto sindical, isso é danoso para os sindicatos. Eu defendo que o trabalhador contribua espontaneamente.

Debate Sindical – O movimento sindical ainda é combativo?
Geraldino Cruz – Sim. Mas tem sindicalista que perdeu contato com a base. Por exemplo, o Porto de Santos. Quanto tempo o porto não faz uma grande manifestação com os trabalhadores? Quanto tempo a Cosipa não pára por causa de uma greve? O nosso sindicato tem feito bastante greve. As nossas assembléias estão cheias. Temos dado resposta para o trabalhador. Mas eu tenho visto aí que tem sindicato que virou “sindicato de arrecadação”, sindicato de carteirinha. O trabalhador realmente tem se distanciado do sindicato. Espero que isso mude com a legalização das centrais sindicais e com a necessidade de ter 25% da categoria filiado ao sindicato.

Debate Sindical – O senhor não tem medo de fazer greve?
Geraldino Cruz – Não, pelo contrário. A função do mecânico é arrumar o motor do carro. A função de um eletricista é levar energia. A função de uma fábrica de automóveis é produzir carro. E a função de um sindicalista é “fabricar” greve. A greve fortalece e engrandece um dirigente sindical. Eu acho que um dirigente sindical que tem medo de greve deve se aposentar e pegar o boné e ir embora. A greve faz parte da luta de um sindicato. A greve tem de ser feita com sabedoria. Tem de fazer tudo direitinho para que o movimento não se arrebente na Justiça. A greve precisa ser justa, bem pensada e tem de ser a vontade do trabalhador, e não a vontade do dirigente sindical.
Fonte: Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar

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